Essa é uma carta de apresentação.
Sou Fabiane Secches, psicanalista, pesquisadora e crítica cultural (literatura e cinema). Também escrevo um pouco de tudo e sinto que o que estudo enriquece minha escuta clínica e, por sua vez, a psicanálise me ajudar a pensar nos outros campos.
Gosto muito de acompanhar newsletters e, por isso, me senti motivada a criar a minha. O título vem de uma música de Rita Lee, artista que ilumina minha vida desde criança. É de uma versão bonita que ela fez de uma música dos Beatles e representa bem o momento que vivo. Há um ano e meio, estou morando na Alemanha, numa cidade chamada Colônia, que tem por volta de um milhão de habitantes. Cerca de treze vezes menor do que São Paulo, a cidade em que vivi mais tempo na vida.
Sou nascida em Minas Gerais, mas me mudei aos dezessete anos para a capital paulista, quando fui aprovada no vestibular. Parece que foi ontem, parece que foi em outra vida. Já tive outras experiências de imigração antes, mas mais curtas. Essa é a primeira vez que tenho um endereço com meu nome na caixa de correio, que vou ao supermercado abastecer a casa, que vou à mesma padaria com frequência, que caminho pelas mesmas ruas como se fossem um pouco minhas também.
O motivo da nossa vinda, minha e do meu marido, foi uma oportunidade legal de trabalho que ele recebeu e a nossa vontade de experimentar como seria morar num lugar com outros costumes, sem me apoiar na nossa língua, o português brasileiro, minha ferramenta de trabalho. Como eu poderia manter parte das minhas atividades por aqui, foi possível fazer essa mudança sem abrir mão delas. Continuo atendendo, pesquisando, escrevendo. Trabalhar em uma língua e sair de casa ouvindo outra tem sido a parte mais estranha e interessante dessa experiência.
Fui ao Brasil duas vezes nesse meio tempo, e logo irei pela terceira. Todas as vezes que chego, sinto: estou em casa. Mas não é de todo verdade. Agora, quando estou em Colônia, ainda que como imigrante que fala poucas palavras em alemão e tem que se virar em inglês, também me sinto em casa. Talvez porque de certo modo me afeiçoei ao que gosto e até ao que não gosto daqui. Então estou entre dois mundos: aqui, ali, talvez espalhada em qualquer lugar.
Nessa newsletter, como nos meus outros textos, penso em escrever sobre livros, filmes e séries a partir da lente da psicanálise. Não sei com que regularidade vou conseguir mantê-la, então, diferentemente de outras newsletters que acompanho, não vou me comprometer em mandar notícias semanais, quinzenais ou mensais. Mas de tempos em tempos. Quem me conhece sabe que embora eu faça muitas coisas, sou defensora da lentidão no lugar da produtividade, então espero que me compreendam nessa jornada.
Vou ficar muito contente se quiserem acompanhar essas andanças e pensamentos. Parte delas me ajudaram a escrever um romance. Talvez a primeira frase desse livro tenha sido escrita em 2021, ainda sem saber no que se transformaria. Mas a experiência de solidão e isolamento, que, para mim, são amigos da criação, me trouxe a possibilidade de retomar a escrita e ir dando forma a ela. O romance deve ser publicado no começo do ano que vem, já tem título e editora e logo vou poder contar mais aqui.
O que descobri sobre mim nesse tempo é que além do apego ao Brasil e à minha gente, eu penso, sinto e existo em língua portuguesa e não quero abrir mão disso. Esse apego certamente me atrapalha com o idioma do dia a dia, mas não é algo que consiga evitar. Há partes de nós que estão sempre em transformação. Opiniões que revisamos, coisas que gostamos e deixamos de gostar, e vice-versa, mas a língua, não. Essa sim é a minha casa.
palavra e imagem
Desde o ano passado, comecei um projeto desafiador para mim. Eu, que sou uma pessoa da escrita, comecei um podcast com a jornalista e pesquisadora Paula Jacob, que sempre admirei muito. Gravamos à distância, ela lá e eu aqui, e esses encontros têm sido uma das melhores partes dos meus dias. As conversas que temos sobre esses mesmos temas da newsletter são tão estimulantes que fico ansiosa pelo próximo encontro. O nome do podcast é Palavra e Imagem, porque falamos de livros, filmes e séries, cada uma a partir de seu repertório, valores, perspectivas. O podcast faz parte de uma publicação chamada Portrait e está disponível nos principais tocadores (acho essa palavra, tocador, muito engraçada).
Tentamos fazer quinzenalmente, mas às vezes o intervalo entre os episódios se estica um pouco mais. Mas estamos lá, regularmente, pensando juntas sobre o mundo contemporâneo ou sobre os clássicos a partir dos nossos dias. Ao menos essa é a nossa proposta e esse é um projeto que me deixa feliz, porque é gratuito, acessível e me faz compartilhar com quem escuta um pouco do que ando pensando. Quem quiser ouvir, deixo o link do Spotify aqui.
sugestões
Ao fim de cada newsletter, quero também deixar algumas indicações de tesouros que encontro pelo caminho: leituras, vídeos, podcasts e perfis de redes sociais que têm me abastecido e me enriquecido.
Dessa vez, vou sugerir um perfil no YouTube que faz análises magníficas sobretudo de filmes e séries, feito com um primor e uma complexidade que raramente encontramos. O nome do perfil é The Nerdwriter, criado por Evan Puschak. Há episódios lindíssimos e se vocês ainda não conhecem, é um projeto que merece entrar na lista de queridos que temos na internet, esse lugar que permite tantos encontros quanto desencontros, e tem se tornado cada vez mais hostil. Um oásis..
Também quero mencionar a leitura do mês do clube do livro de literatura e psicanálise que coordeno, o romance Mata Doce, de Luciany Aparecida, vencedor do último prêmio São Paulo. Deixo aqui o link para uma entrevista concedida ao videocast Histórias Diversas, em que a autora conta um pouco mais de sua jornada como leitora e como escritora.
E, por fim, mas não menos valiosa: essa entrevista nesse mesmo videocast com a brilhante Juliana Leite, autora de Entre as Mãos e Humanos Exemplares, uma das escritoras mais talentosas e originais de sua geração. Sou fã de carteirinha.
A imagem que ilustra o início desse texto é um detalhe da pintura "Gare Saint-Lazare", de Edouard Manet (1873).
Oi Fabi, gostei de saber que moramos tão perto uma da outra. Não nos conhecemos, mas por participar do ateliê de escrita da Ana Rüsche e já ter ouvido teu nome tantas vezes, parece até que te conheço! Quem sabe isso não acontece, não é mesmo? Continuarei te acompanhando por aqui! Um abraço :)
Oi, Fabiiii <3 ansiosa pra te ler de novo!